segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Natal Amazônico (se Jesus fosse paraense...)


“E aconteceu naqueles dias que saiu um decreto da parte do Excelentíssimo Senhor Presidente da República, para que todo o mundo participasse do Censo. E todos iam alistar-se, cada um à sua própria cidade. E subiu também José, da cidade de Santarém, à cidade chamada Belém, a fim de alistar-se com Maria, sua esposa, que estava grávida.

E aconteceu que, estando eles ali, se cumpriram os dias em que ela havia de dar à luz. E deu à luz a seu filho primogênito, e envolveu-o em fraldas, e deitou-o num tacho de farinha de mandioca, porque não havia lugar para eles na palafita.

Ora, havia, na região das ilhas, pescadores ribeirinhos que trabalhavam durante as vigílias da noite. E eis que o anjo do Senhor veio sobre eles, e a glória do Senhor os cercou de resplendor, e tiveram grande temor.

E o anjo lhes disse: Não temais, porque eis aqui vos trago novas de grande alegria, que será para todo o povo: Pois vos nasceu hoje, na cidade de Belém, o Salvador, que é Cristo, o Senhor. E isto vos será por sinal: Achareis o menino envolto em fraldas, e deitado num tacho.

E, no mesmo instante, apareceu com o anjo uma multidão dos exércitos celestiais, louvando a Deus, e dizendo: Glória a Deus nas alturas, Paz na terra, boa vontade para com os homens.

E aconteceu que, ausentando-se deles os anjos para o céu, disseram os pescadores uns aos outros: Vamos, pois, até Belém, e vejamos isso que aconteceu, e que o Senhor nos fez saber.

E foram apressadamente, e acharam Maria, e José, e o menino deitado no tacho. E, vendo-o, divulgaram a palavra que acerca do menino lhes fora dita; e todos os que a ouviram se maravilharam do que os pescadores lhes diziam. Mas Maria guardava todas estas coisas, conferindo-as em seu coração.

E voltaram os pescadores, glorificando e louvando a Deus por tudo o que tinham ouvido e visto, como lhes havia sido dito.”
(paráfrase de Lucas 2.1-2)
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Me impressiona e inspira o fato de que Jesus era alguém do povo, um homem nascido numa cidade real e histórica, mas pequena em relação a Jerusalém; criado numa região periférica da nação, a ponto de Natanael ter perguntado de forma preconceituosa: “Pode vir alguma coisa boa de Nazaré?” (João 1.46). Um jovem falando em parábolas sobre o Reino de Deus, pregando o amor e a paz.

Gosto de imaginar que, se Jesus fosse brasileiro, e se fosse paraense, teria sido visitado, ainda bebê, por alguns pajés que o teriam presenteado com vasos de cerâmica decorada, patchouli e banhos de ervas. Diferente, não? Pensar que ele foi visitado por magos do oriente, que certamente estudavam os sentidos ocultos dos astros e outras coisas.

Se Jesus fosse paraense, teria navegado muitas vezes entre Belém do Pará, Macapá, Santarém e Manaus, visitando as populações suburbanas e ribeirinhas, onde teria feito seu ministério, multiplicando farinha e tucunaré para alimentar a comunidade. Entre seus discípulos mais chegados, alguns pescadores, um fiscal da receita federal e um ativista do MST.

Em sua última janta (na Bíblia chamada de “ceia”), teria tomado a vasilha de açaí nas mãos, dizendo aos discípulos: “Este é o novo testamento no meu sangue; fazei isto todas as vezes que beberdes, em memória de mim.” E, da mesma forma teria feito com a farinha de tapioca, dizendo: “Tomai, comei; isto é o meu corpo que é partido por vós; fazei isto em memória de mim.” (1Coríntios 11.24-25)

Teria sido traído por um deles, que o entregou à Polícia Federal em troca de um salário mínimo, e teria morrido em Brasília, junto a ladrões, acusado de causar perturbação pública.

Nós, brasileiros, provavelmente teríamos ficado sabendo de sua morte naquele mesmo dia, via rádio, televisão, jornais e internet. Muitos iriam rir, dizendo: “Morreu mais um maluco.” Outros diriam, como Natanael: “Pode vir alguma coisa boa do Norte?”. Outros iriam ler e ouvir sobre o seu ministério e dizer: “Verdadeiramente este homem era o Filho de Deus.” (Marcos 15.39).

Mas eu me pergunto seriamente: qual seria a minha atitude se Jesus vivesse nos dias de hoje? Eu o escutaria? Eu o abrigaria em minha casa? Eu andaria com ele? Eu me arriscaria a ser confundido com um de seus seguidores “malucos”? Eu comeria com ele à mesma mesa? Aceitaria andar como ele andou, misturado com o povo, ensinando os pobres, condenando os ricos e contrariando os sacerdotes?

Eu sou, ou não sou um discípulo de Jesus?

Encerro com este texto intitulado Bênção Franciscana, atribuída a Francisco de Assis. No advento desde ano de 2011, faço desta bênção a minha oração para a vida de cada um que me lê, assim como para mim mesmo.

Que Deus te abençoe com
um desconforto inquietante sobre as respostas fáceis,
as meias verdades e as relações superficiais,
para que possas buscar a verdade corajosa
e viver profundamente em teu coração.

Que Deus te abençoe com sagrada raiva à injustiça,
à opressão e à exploração de pessoas para que possas trabalhar incansavelmente pela justiça,
liberdade e paz entre todas as pessoas.

Que Deus te abençoe com o dom de lágrimas
para derramá-las com aqueles que sofrem de dor,
rejeição, fome ou a perda de tudo aquilo que eles amam,
para que possas estender a mão para lhes dar conforto
e transformar a sua dor em alegria.

Que Deus te abençoe com a tolice suficiente
para que creias que realmente podes fazer diferença neste mundo,
para que possas com a graça de Deus,
fazer aquilo que os demais insistem ser impossível.

E que a benção de Deus, Suprema Majestade e nosso Criador,
Jesus Cristo a Palavra encarnada que é o nosso irmão e Redentor,
e o Espírito Santo, o nosso Advogado e Guia,
seja contigo e permaneça contigo e com todos,
hoje e para sempre.

Amém.

domingo, 7 de novembro de 2010

A todos os sotaques: teologia e ministério cristão no Brasil


Penso que um ministério cristão no Brasil que não alcance as feridas sociais do brasileiro – para tratá-las, aliviá-las e, quiçá, curá-las por meio da ação da igreja e do Espírito Santo – não será um ministério completo.

Será que a igreja e seus ministros devem trabalhar para alcançar resultados, como numa relação de causa e efeito? Certamente que sim. Trabalhar de forma ordenada é necessário e útil ao trabalho da igreja. Porém é necessária muita cautela, pois alcançar resultados mensuráveis nunca deve ser tornar, para a igreja, um fim em si mesmo.

A finalidade da igreja deve ser, como diz o lema da Missão Integral, levar o evangelho todo ao homem todo, no mundo todo. O evangelho todo não se resume na mensagem salvífica da morte de Jesus, porém contém necessariamente essa mensagem. Alcançar o homem todo não indica apenas todos os homens, mas também alcançar o homem em sua totalidade, tangendo cada recôndito da alma desse homem, desde seu mais íntimo pensamento até a cultura em que está inserido.

A necessidade de afinar o ministério cristão com o trabalho social da igreja emerge da carência de identidade na consciência histórica e cultural do homem de hoje. Um povo sem memória é um povo sem identidade, sem consciência de sua cultura, de seu papel social e de seu poder de mobilização.

Entretanto, quando o homem reconhece seu papel social e decide construir a partir de hoje a memória de amanhã (que será a identidade de seus filhos), então ele está construindo um caminho de esperança e de salvação para si próprio e para sua cultura.

Nesse sentido, a igreja brasileira tem o papel fundamental de restabelecer no coração de cada patrício sua identidade e a esperança da salvação, seja pela transformação do mundo em que vive, seja pela restauração de sua própria alma, mediante o poder do Espírito Santo – ou seja, não apenas para tirar o homem da pobreza e opressão em que vive, mas para ao lado disso alcançá-lo com o Evangelho de Jesus, motivo primeiro de nossa missão.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Incêndio: a parte que não sai no jornal


"Depois de medicada, retirou-se pro seu lar
– aí a notícia carece de exatidão.
O lar não mais existe, ninguém volta ao que acabou.

[...] Ninguém notou, ninguém morou na dor que era o seu mal,
a dor da gente não sai no jornal."
(Chico Buarque - Notícia de Jornal)

Esta manhã, meus irmãos e eu fomos poupados de uma tragédia.

Ao chegar no prédio, à hora do almoço, vi pessoas entrando e saindo, um alvoroço diferente do comum. Os elevadores estavam desligados, havia sujeira, água e cheiro de fumaça pra todo lado.

– Foi o incêndio! – logo alguém me disse.

Que sensação estranha! Subir as escadas sem saber exatamente o que houve. Encontrar o corredor do apartamento cheio d'água. E, em seguida, saber que o fogo foi perto do nosso apartamento...

Fui até o 5º andar, onde o fogo começou. Na sala do apartamento, um sofá chamuscado e algumas cadeiras que restaram. Uma estante com algumas coisas recolhidas. Os quartos e banheiro, reduzidos a pó e cinzas, ainda ferviam de calor.

Em pouco tempo, fiquei sabendo como acontecera: o casal estava dormindo, pela manhã, quando percebeu algo estranho. Os dois se levantaram e foram até o quarto de hóspedes. Ao abrirem a porta, viram a cama já em chamas. Foi o tempo exato de saírem de casa e o fogo entrou no quarto deles – um pouco mais, e não teriam conseguido sair.

Trouxeram a mangueira de incêndio e conseguiram pelo menos molhar alguns móveis na sala, que não foram atingidos pelo fogo. Em pouco tempo, chegaram os bombeiros e conseguiram evitar que algo pior acontecesse.

Algo pior?

Sentada numa das cadeiras, olhando as cinzas a que se reduzira a sua casa, a moradora falou:

– Por quê? Por quê? Tanta gente ruim neste mundo, fazendo coisas erradas, tanto político roubando dinheiro do povo... e a gente aqui, ajudando as pessoas, tem que passar por isso...

A fumaça e o calor mataram o passarinho, que seria solto ainda esta semana. O fogo pegou alguns dólares, que estavam guardados. As chamas lamberam cabelos, lanharam carne, devassaram alguns sonhos.

Diante de uma tragédia, não há explicação, não há conforto, não há sossego para a alma.

Sim, poderia ter sido pior. O fogo poderia ter tomado todo o prédio. Poderia ter destruído outros apartamentos. Alguém poderia ter morrido.

Mas penso que não se mede o sofrimento dos outros. A dor dói, e pronto.

Um livreto repousava sobre o sofá, cheio de fuligem:

– É o livro de sabedoria. – disse a moradora – O fogo não pegou ele.

Uma vizinha abriu em uma página aleatória, que dizia: "Como viver eternamente." Algo sobre observar o dia de hoje, aprender com suas lições e ajudar as pessoas que estiverem por perto.

Nada tão aleatório poderia ter sido mais próprio. Como disse um sábio, melhor é ir a uma casa onde há luto do que a uma casa onde há festa, porque a morte faz as pessoas pensarem na vida. (Eclesiastes 7.2)

Terá sido o acaso? Existe o acaso?

Quando a vida é a única coisa que resta, não adianta chorar.

Quando falta o braço, a mão amiga não tem preço.

Quando Deus é o único horizonte, erguer os olhos e dar o próximo passo é sinal de esperança e de vida.

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Equinócios (ou Vilarejo: eu vi o céu)

Belém-PA, Cidade Velha. André Coelho, 2006.

Quem freqüenta o Farinha de Tapioca sabe que eu não tenho o costume de postar aqui letras de música. Não é que eu não goste. Na verdade, gosto tanto que criei um blog exclusivo para postar as letras das minhas músicas favoritas, chamado Das Canções a que Sou Preso.

Mas hoje, no comecinho da noite, enquanto eu fazia meu trajeto diário até a colina do Seminário do Sul, onde estudo, cruzando de ônibus as ruas da Tijuca, lembrei-me de uma de minhas canções favoritas da Marisa Monte (daquelas que vivem atadas à alma mesmo) e que, geralmente me remete à Cidade Velha de Belém, ou a Óbidos.

E pela primeira vez visualizei o céu (o céu cristão mesmo, também chamado de paraíso) de uma forma que nunca havia feito antes, profundamente espiritual e tupiniquim:

VILAREJO
Marisa Monte, Pedro Baby, Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown


Há um vilarejo ali,
onde areja o vento bom.
Na varanda, quem descansa
vê o horizonte deitar no chão
pra acalmar o coração.
Lá o mundo tem razão;
terra de heróis, lares de mãe,
paraíso se mudou para lá.

Por cima das casas, cal;
frutos em qualquer quintal.
Peitos fartos, filhos fortes,
sonhos semeando o mundo real.
Toda gente cabe lá,
Palestina, Shangri-lá.

Vem andar e voar...

Lá o tempo espera,
lá é primavera.
Portas e janelas
ficam sempre abertas
pra sorte entrar.
Em todas as mesas, pão;
flores enfeitando
os caminhos, os vestidos,
os destinos. E essa canção
tem um verdadeiro amor
para quando você for.

Hoje é Equinócio. Dia e noite do mesmo tamanho. Evento que só acontece duas vezes ao ano e que marca exatamente a entrada do outono (em maio) e da primavera (em setembro).

Não gosto dos dias longos demais do verão. As noites estendidas do inverno até que me agradam bastante.

Mas, no céu que eu imagino, todo dia é Equinócio, como acontece na linha do Equador.

João, na Ilha de Patmos, visualizou o céu com ruas de ouro.

E você?

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Te Vejo, Belém

André Coelho

Deste meu rio de nuvens que me trazem do Rio de Janeiro,
avisto agora uma bruta floresta,
um rio monumental.

Minha alma canta,
como Jobim!
bebo Waldemar!

Eis que vejo meu rio de concreto e de mangueiras...

Ah! Belém!
Quanto tempo desta vez?

Tenho sonhado com teu céu,
tuas nuvens,
teus igarapés...
teu chão.

Chão que agora me recebe
no coração da floresta
de pau e pedra;
um ribeirinho da cidade.

Chão que me conhece,
que tem meu cheiro,
meu peso,
minha religião,
minha alma.

Te vejo, Belém,
da janela deste avião
e não consigo conter uma lágrima teimosa.

(pausa para uma outra lágrima).

Estou louco para suar de novo nas tuas manhãs,
para tirar a minha sesta na tua tarde,
pra sentir a brisa de água-doce da tua noite.

Vem cá, Belém,
dá cá um abraço...
Cheguei!


7 de setembro de 2010

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Umãpe Xe Raperana?*

Em tupi: "Onde será o meu caminho?"


* Frase citada por Ceumar Coelho na canção Banzo.

Solo de um ribeirinho: a mesma periferia (impressões sobre o filme 5x Favela)

Diante da realidade exposta pelo diretores Manaíra Carneiro, Wagner Novais, Rodrigo Felha, Cacau Amaral, Luciano Vidigal, Cadu Barcellos e Luciana Bezerra no filme 5x Favela – agora por nós mesmos, vem a mim uma série de perguntas iniciais: Qual é o Brasil? O que os brasileiros entendem por Brasil e brasilidade? Qual a identidade do brasileiro? O que faz do Brasil Brasil, em qualquer lugar do Brasil?

O filme tem um ar ao mesmo tempo côntico – dadas as narrativas, que lembram alguns contos de Carlos Drummond de Andrade e Lígia Fagundes Telles – e profundamente realista, numa descrição minuciosa da vida nas favelas cariocas, a qual chega a ser ainda mais verossímil do que nas produções Tropa de Elite (José Padilha, 2007) e Cidade dos Homens (Rede Globo, série, 2002-2005).


O quinto episódio do filme, Acende a Luz, dirigido por Luciana Bezerra, foi para mim o mais marcante, não pelo enredo, mas pela simbologia da idéia central, das cenas e dos argumentos.

É véspera de Natal e os moradores do morro estão sem luz. Os técnicos da companhia de energia elétrica não deram conta de restabelecer o funcionamento de um equipamento e, num esforço para tentar garantir que o serviço seja concluído antes do anoitecer, os moradores “seqüestram” um dos técnicos.

Mas a estratégia não surte o resultado desejado e, depois de muita insistência, tudo o que o técnico consegue é fazer a luz funcionar em apenas um poste em todo o morro. E é exatamente sob a luz deste único poste que a vizinhança vem comemorar o seu Natal.

A cegueira que se impõe pela falta da luz. A esperança e a espera pelo seu brilho. Uma luz dada aos homens na noite de Natal. A festa que a todos congrega. O encontro dos diferentes sob a luz.

São todos certamente temas muito interessantes para uma reflexão sobre o episódio e sua relação com o próprio sentido do Natal de Jesus.

Mas outro detalhe me vem.

Na trilha sonora de Acende a Luz, a primeira música executada chama-se Solo do Ribeirinho. Ao contrário do que a própria proposta inicial do filme possa sugerir, a música não é um funk carioca, mas uma guitarrada, ritmo tipicamente paraense, filho “pobre” das antigas guitarradas portuguesas, irmão do carimbó, e parente não muito distante do merengue caribenho, do brega paraense e da jovem guarda – referências comumente citadas pelos tradicionais mestres da guitarrada, como Aldo Sena, Curica e Vieira, ou pelos apreciadores do ritmo.

E surge uma nova questão: o que um ritmo tradicional muito pouco conhecido, que não é nacionalmente popular como a Banda Calypso, executado por mestres tocadores de viola do interior do Pará, tem a ver com a favela carioca?

Um caminho de resposta está em olhar para a periferia. O que nos dizem os moradores da favela da maré? O que nos dizem os ribeirinhos do rio Tapajós? Quais as cores e as dores dos sertanejos do Caicó e dos pescadores de Paraty? Que anseios trazem no coração os guarani do Rio Grande do Sul e os negros do Silêncio do Matá, no coração da Amazônia, próximo a Óbidos?

No princípio de 2008, acompanhei a notícia dos suicídios frequentes em tribos indígenas do Mato Grosso do Sul: em apenas um mês, mais de dez jovens se suicidaram. Um deles, que havia se enforcado, pendia em uma corda amarrada a um galho de árvore e trazia sob os pés, no chão, a inscrição: “Eu não tenho lugar”.

O anseio é um só, o grito é um só. É o grito da periferia pelo espaço, pela liberdade, pelo respeito. É um anseio, um profundo anseio, por dias melhores. Por um dia em que a luz brilhe tanto, que não mais sejam necessárias a luz do sol, da lua ou dos bulbos das lâmpadas incandescentes.

Concluo este artigo com um poema que é uma letra de música. Na verdade, um lundu¹.

O poema fala de sede, de água e de uma vida que corre como um rio.

Para o coração dilacerado e ressecado pela pobreza e pelo desrespeito, há uma água tão pura que nem existe no mundo, mas que pode ser experimentada no coração de quem tem a Jesus.

É setembro, mês em que voltam as chuvas no Brasil. Esperança de fim das queimadas que assolam o país. Esperança de boa safra no próximo verão. Esperança de libertação para os pés que foram colocados de escanteio. Esperança de salvação para o coração do homem.


Alto Mar
Arlindo Lima

Começa o dia de novo,
o sol ainda finge de morto.
Minha vida é esse rio,
represa de desafio,
que o vento filtra os brios,
pois é necessário regar.

Vamos molhar,
água levar...

“A água da vida eu cedo”.
A sede afoga o moleque
e, quanto mais cedo ela cede,
mais cedo na pesca ele investe.
A profundeza estremece,
pois vamos ganhar alto mar.

Vamos pescar,
água levar...

Mas temo a maré quando baixa,
pois nem chuva forte lhe basta.
Eu me distancio da margem,
o barro é a minha imagem.
Então busco a fonte, verdade,
pra água da vida tomar

Vou me molhar,
água tomar...


Ouvir "Mestres da Guitarrada - Solo do Ribeirinho"


Ouvir "Arlindo Lima - Alto Mar"



NOTAS
1. Lundu: dança ritmada por tambores, parte do folclore nortista paraense registrado por Mário de Andrade em suas viagens pelo Brasil nas primeiras décadas do século XX e ainda hoje muito apreciada nas rodas de danças folclóricas em Belém.


FONTES
5x Favela: agora por nós mesmos. Disponível em: www.5xfavela.com.br, acesso em 02 de setembro de 2010.

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

Inca, o Império do Ouro (Prefácio à 2ª edição)

Desenho feito por Jamir Freire,
quando éramos acadêmicos
de Arquitetura e Urbanismo
na UFPA (Belém, PA).
Depois de tentar por várias vezes (anos seguidos), acessar o site original Inca, o Império do Ouro, criado por mim há quase 10 anos no Vilabol (que simplesmente ignora quando peço para recuperar meu acesso ao site), resolvi desistir e aceitar a sugestão da minha amiga Lília Marianno de postar aqui no blog o material do site.

O site é a reprodução e publicação online de uma monografia produzida em grupo quando fiz faculdade de arquitetura. Por isso, divido os créditos com Ana Roberta e Fernanda.

Tive que fazer algumas pequenas adaptações para o formato blog, mas acredito que tenha ficado bem fácil de ler e navegar.

Então aqui vai: Inca, o Império do Ouro.

Tenham todos uma boa leitura!

Inca, O Império do Ouro: considerações finais e referências


É uma pena que uma civilização de cultura tão rica tenha sido de tal forma dizimada por um povo que se dizia civilizado. O conhecimento dos incas em muitos campos, tais como astronomia, medicina e agricultura era certamente superior ao europeu, de tal modo que a cultura do mundo de hoje ainda usa muito da tecnologia criada pelos incas naquela época.

O mundo moderno não pode fazer idéia de quanto conhecimento perdeu com a extinção desse povo. Certamente, valiosíssimos tratados científicos devem ter sido destruídos na invasão e o nível de organização que resta ainda hoje entre os descendentes dos incas não representa nem um centésimo do império que um dia foi o mais poderoso da América do Sul.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


A BÍBLIA SAGRADA; TRADUÇÃO NA LINGUAGEM DE HOJE. São Paulo. Sociedade Bíblica do Brasil, 1988.

AS GRANDES MARAVILHAS DO MUNDO; MARAVILHAS CRIADAS PELO HOMEM. . Reader’s Digest Vídeo, .

ATLAS DO EXTRAORDINÁRIO; LUGARES MISTERIOSOS II. Espanha. Prado, 1995.

BOLTSHAUSER, João. História da arquitetura. Belo Horizonte. , 1966.

CAPDEVILA, Arturo. Los Incas. Barcelona. Labor, 1947.

DICIONÁRIO ESPANHOL/PORTUGUÊS. Porto. Porto, 1990.

ENCICLOPÉDIA MULTIMÍDIA DA ARTE UNIVERSAL; ARTE ORIENTAL, AFRICANA, PRÉ-COLOMBIANA E OCEÂNICA. . AlphaBetum, .

ENCICLOPÉDIA NOVO CONHECER III. São Paulo. Abril, .

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro. Nova Fronteira, 1986.

GRANDE HISTÓRIA UNIVERSAL II. Rio de Janeiro. Bloch, 1973.

HAGEN, Victor Wolfgang Von. Los Reino Americanos del sol; aztecas, mayas, incas. Barcelona. Labor, 1964.

HISTÓRIA DAS CIVILIZAÇÕES III. São Paulo. Abril Cultural, 1973.

LEVILLIER, Roberto. Los Incas del Perú II. Buenos Aires. Porter, 1942.

RIVA-AGÜERO, José de la. Las Civilizaciones Primitivas y el Imperio Incaico; estudios de historia peruana. 1966.

Os últimos incas: a morte da civilização Inca



De acordo com a tradição, todo Inca deveria casar-se com uma mulher de sangue real nascida em Cuzco. Huayna Capac o fez e desse casamento, sem alegria, nasceu Huáscar (“o odiado”), herdeiro legítimo do trono. No entanto, Huayna estava apaixonado pela princesa de Quito; e desse amor, presenciado com horror pelo Império, nasceu seu querido filho Atahualpa (“filho da fortuna na terra”).

Os filhos cresciam: Huáscar, amado pelo povo e malquerido pelo pai, e Atahualpa, amado pelo pai e alvo de revoltas dos cortesãos de Cuzco. O coração do reino estava divido entre os dois príncipes, que cresceram em constante rivalidade.

Arturo Capdevila, em seu livro intitulado Los Incas, retrata com expressividade a situação do Império:

Sombrio ocaso foi a vida de Huayna Capac. Seus filhos rivais torturavam-lhe a consciência com quem sabe quais duras previsões. Sinais nefastos manchavam o céu pátrio. De espanto em espanto, em misteriosa onda de lenda, corria no entardecer de seu reinado a fama dos espanhóis recém-chegados, homens brancos desembarcados um dia com temível desígnio pelo confim setentrional do país. O céu e a terra assinalavam presságios. Meteoros cárdeos rasgavam o firmamento na noite. Uma auréola de fogo dividida em três círculos rodeava o disco da lua. Os llaycas agouravam o Inca: 'o primeiro círculo anuncia guerra; o segundo, a queda do sol; o terceiro, o fim de tua raça.' 

Tudo isso se pressentia no reino do Peru. As próprias cerimônias realizadas pela morte de Huayna dão por sua parte um sinal disso. Uma espécie de loucura trágica estava impregnada na alma popular. Ao celebrar as exéquias de Huayna, bem entenderam que se despediam de seu último Inca. Nunca o templo de Tampu, próximo a Cuzco, presenciou mais solene homenagem. Os palácios reais foram clausurados por todo o Império. Fanatismo, fatalidade e loucura indicavam a iminência da queda. Imagina-se com espanto aquela pira de suplício alçada em honra ao Inca morto. Supõe-se que 4 mil vítimas voluntárias, entre concubinas e servos, dançaram e sucumbiram naquela fogueira em que já fumegava o vento vazio, a antiga glória do Peru.”

Antes de morrer, Huayna resolvera quebrar a tradição Inca e repartir o reino entre seus dois filhos: Atahualpa, que seria o monarca do Norte, e Huáscar, que o seria do Sul. Decidira também, em fidelidade à esposa amada, ser enterrado na cidade de Quito, junto às múmias de seus antepassados.

O cisalhamento do reino preparava obscuramente o império para o triunfo dos homens brancos. Em 1531, os exércitos de Atahualpa e Huáscar se confrontaram numa sangrenta batalha fratricida em Ambato e Quipaypán, da qual Atahualpa se saiu vencedor. Mas isso iria durar pouco tempo, como bem o sabiam os amautas e haravecs, povos de ciência e saber ocultos; para eles, Atahualpa não era na verdade um Inca, um legítimo filho do Sol; era um intruso.

Então, em 1532, Pizarro, conquistador espanhol, foi recebido por Atahualpa em Cajamarca, onde, na primeira oportunidade, aprisionou o imperador, iniciando a destruição do império.
Atahualpa foi morto por ordem de Pizarro. O povo já não tinha seu deus – era inconcebível como um deus poderia ter sido destruído tão facilmente por aqueles homens.

Assim foi a queda da tradição religiosa incaica; assim foi a queda do tão poderoso exército; assim foi a queda da capital, Cuzco. Assim foi a morte do Império Inca.

Mas certo era que a lua havia se mostrado envolta na tríplice sinistra auréola. O invasor já começava a apoderar-se do solo americano e se cumpria, a seu tempo, a palavra profética de Nezahualcoyotl: virão tempos em que serão desfeitos e destroçados os vassalos, e tudo cairá nas trevas do esquecimento…” (CAPDEVILA, Los Incas, p.164).

Os últimos incas: os imperadores e as guerras de expansão



Na ambição de mais poder e riquezas, o que é natural ao ser humano, foram iniciadas, no governo do sétimo Inca, Yahuar Huaccac, as guerras de expansão do império. O primeiro povo a ser conquistado foram os collas ou aimaras, que viviam em torno do lago Titicaca.

O sucessor de Yahuar Huaccac, Huiracocha, conquistou os araucanos e changos do litoral chileno com um exército de 20 mil homens.

Além de manter a expansão do império, o Inca seguinte, Pachacutec tornou-se notável por ter construído o grande templo de Cuzco e a Casa das Virgens do Sol e por ter instituído o recenseamento populacional periódico e o pagamento de impostos pelo cultivo das terras dos incas.

Tupac Yupanqui, o décimo Imperador Inca, filho de Pachacutec, realizou novas conquistas, tendo chegado ao rio Maula, na região do Chile.

Depois dele, Huayna Capac foi o último grande Inca. Durante seu governo, o império alcançou sua extensão máxima: incluía toda a região do atual Peru, desde os Andes orientais ao Pacífico, incluindo as regiões montanhosas do Equador até Quito, parte do planalto boliviano e da costa chilena, ao norte do rio Maula (durante algum tempo, chegou a incluir a parte andina do nordeste argentino).

Entretanto, apesar de a ocupação de Quito ter sido o maior feito de Huayna Capac, ele não imaginava que mal essa conquista viria a fazer ao Império.

terça-feira, 10 de agosto de 2010

A vida dos Incas: arte e ciência



A cultura inca — resultado da mistura das culturas preexistentes na região andina — era muito rica, principalmente no que se refere à arte, intimamente ligada à ciência, à religião e ao cotidiano.

A ourivesaria inca possuía caráter funcional e ornamental; o desenho das peças, aspecto de desenhos geométricos. O figurativismo das estatuetas de metal era bem estilizado, tendo a cabeça mais trabalhada que o restante do corpo. A prata era um dos metais mais apreciados para as peças suntuosas, embora se tivesse conhecimento de metais como o ouro. Nessa arte, destacam-se também as facas de sacrifício.

A cerâmica e estamparia caracterizavam-se pela falta de exagero e opulência, assim como pela presença do irregular ou assimétrico. A diversidade de cores propiciou às obras mais vida, com preferência aos tons de terra e ocre.

As construções arquitetônicas incas, apesar da austeridade em relação às dos maias e astecas, não possuem hoje ornamentos esculpidos, o que se deve principalmente ao fato de os espanhóis terem extraído os trabalhos de escultura em ouro que revestiam as paredes dos aposentos internos.

Mas o que marcou, sem dúvida, a arquitetura inca foi o trabalho com a rocha; obras civis de pouca importância, fortalezas, torres, templos, palácios e edifícios do governo tinham em suas estruturas pedras arduamente trabalhadas e esculpidas pelos trabalhadores incas. Tais pedras eram constituídas do mais puro granito branco e seus vértices esculpidos em diversos ângulos (de até 40 graus) de tal maneira que os blocos se encaixassem perfeitamente uns nos outros sem a utilização de argamassa ou cimento e que o espaço entre um bloco e outro fosse impenetrável mesmo pela mais fina lâmina. As pedras, para que pudessem resistir aos freqüentes tremores de terra, tinham forma trapezoidal e eram tão pesadas que chegavam a atingir três toneladas.

Não se sabe, entretanto, o tipo de instrumento utilizado na construção das cidades incas, já que não há vestígios de ferramentas ou rodas. Hipóteses criadas pelos próprios nativos da região dizem que tais ferramentas seriam constituídas de hematita oriunda de meteoritos. Todavia, segundo os cientistas, essa hipótese é um tanto improvável.

É incontestável a engenhosidade de certas construções incas, como por exemplo os canais que transportavam água a poderosas cisternas, para que fosse enfim armazenada sem desperdícios, ou mesmo os diversos níveis de terraços, nos terrenos íngremes da região, que permitiram um melhor aproveitamento da terra para a agricultura.

Sabe-se que as maiores e mais famosas cidades-fortalezas da civilização inca são Sacsahuamán e Macchu-Picchu. Essa última é conhecida como “cidade perdida dos incas”; é um complexo de templos, palácios, observatórios e residências das classes governantes.

A posição privilegiada de Macchu-Picchu permitiu aos incas a execução de profundos estudos científicos e muitos cultos religiosos, principalmente no que se refere ao sol. Por isso, a cidade era considerada um verdadeiro santuário.


Dentro de seu conjunto arquitetônico, formado por mais de 200 edifícios, destacam-se o Observatório Solar e dois grandes templos: o Principal e o das Três Janelas.

No Observatório, encontra-se a Intihuantana (“lugar de pouso do sol”), uma pedra sagrada que tinha como objetivo o culto ao deus Sol (“Inti”), e que servia como instrumento científico para as observações astronômicas e cálculos meteorológicos sobre a forma redonda do céu que ajudavam a prever a época propícia para a colheita.

No Templo Principal, destaca-se um edifício semicircular com três metros de diâmetro por dois e meio de altura, constituído por enormes blocos de granito. Essa construção demonstra o alto nível arquitetônico atingido pelos incas,  já que a técnica do trabalho com círculos veio a se desenvolver tardiamente.

O Templo das Três Janelas é bem parecido com o Templo Principal quanto à estrutura, com seus blocos perfeitamente talhados. Sua planta baixa é quadrada e apresenta apenas três janelas (por isso o nome dado a ele).

Supõe-se que as mais importantes cidades incas possuíam um Templo do Sol — abrigo para as Virgens do Sol (“acllas”), mulheres escolhidas para executarem serviços reais nos Templos e durante os rituais — além de um Palácio Real.

A cidade de Macchu-Picchu foi conservada em segredo pelos imperadores incas afim de evitar contato com os conquistadores espanhóis. Transferiu-se, então, a civilização para as cidades de Victos e Vilcabamba. Até a sua revelação ao mundo pelo historiador Hiram Bigham, Macchu-Picchu permaneceu intocada. As geleiras, selvas equatoriais e fortes correntezas dos rios colaboraram para tal conservação.

Há uma hipótese sobre a maneira com a qual foram construídas as cidades incas que supõe terem os engenheiros e arquitetos dessa época se baseado em observações astronômicas para definir os locais e posições exatos para erguer os prédios.

Os conhecimentos de Geometria e Geografia adquiridos pelos cientistas incas foram provavelmente utilizados nas construções de cidades famosas como Macchu-Picchu, Cuzco e Ollantaytambo, assim como devem ter servido para determinar as melhores épocas de plantio e de colheita, uma vez que os incas possuíam uma agricultura de subsistência tão avançada que superava a européia do mesmo período.

Acontece que, para o posicionamento de determinadas construções, como os prédios da cidadela de Macchu-Picchu, os incas deveriam saber a exata localização dos pontos cardeais e, para isso, saber o local exato do nascer e do pôr do Sol no horizonte nos dias de equinócios. Como eles poderiam sabê-lo, já que a cidade é rodeada pela Cordilheira dos Andes e não se pode ver o sol tocar o horizonte? Talvez o tenham feito através de observações sistemáticas do movimento do sol no céu.

A vida dos Incas: aspectos político-econômicos



O ayllu consistia na unidade social básica do império. Era uma espécie de clã, um grupo de famílias que viviam juntas dentro de uma área definida, compartilhando da mesma terra, animais e outras coisas. Essa unidade social podia ser grande ou pequena, estendiam-se até formar uma aldeia ou grande centro ou até mesmo uma cidade inteira. Cuzco, a capital, era nada mais que um Ayllu ampliado.

Individualmente, ninguém possuía terras; O ayllu constava de um território definido, e os que viviam nele dividiam a terra. É importante lembrar que os incas não criaram o Ayllu, já que essa organização faz parte da evolução da sociedade andina, mas o sistematizaram e ampliaram.

Um Ayllu é governado por um chefe eleito e assessorado por um concelho de anciãos. Existe ainda um chefe de distrito, que é responsável por um determinado grupo de Ayllus, que por sua vez formam um território e que se unem para construir "uma das partes do mundo", governada por uma espécie de prefeito, ao qual só cabia responder ao soberano Inca.

O modo político e econômico define a estrutura piramidal e decimal desse império, que na base encontra o puric, o obreiro robusto. Cada dez obreiros eram mandados por um capataz; cada dez capatazes, por um sobrestante, que tinha por sua vez um supervisor, o chefe da aldeia. Essa hierarquia, composta por dez mil trabalhadores, assim continuava até chegar no chefe da tribo.

Uma vez ao ano, a cada outono, as terras do ayllu eram repartidas entre seus membros. Para cada novo casal, era entregue o jefe, que equivalia a aproximadamente uma área de noventa por quinze metros. A distribuição de terras se baseava no número de filhos que tinham que manter.

A terra comum do ayllu se repartia do seguinte modo: primeiro para o povo; em segundo lugar para o Inca, ou seja, para o Estado; e em terceiro para a religião do Sol — era uma espécie de dízimo. As porções de terra pertencentes ao Estado ou à religião eram cultivadas comunalmente, como parte de um imposto, em forma de prestação pessoal.


Todo o reino Inca, inclusive os andes, o deserto e o alto amazonas, converteu-se num grande centro de domesticação de plantas silvestres. Mais da metade dos alimentos que o mundo consume hoje foi desenvolvida por esses camponeses andinos. Calcula-se que ali, mais que em qualquer outra zona do mundo, se cultivou grande número de alimentos e plantas medicinais de forma sistemática. Mencionemos só as mais importantes: duzentas e quarenta variedades de batata, além de milho, abóbora, feijão, abacaxi, caju, cacau, mamão, tomate, pimentão e abacate, entre outros.

A batata é a principal planta comestível do alto dos andes. Em nenhum outro lugar como o Peru existem tantas variedades de batatas. São mais de duzentas e trinta espécies.
O milho compartilha com a batata as honras de constituir alimento básico e de qualidade. Esses vegetais são extremamente resistentes às condições climáticas dos andes.

O ano do trabalhador andino se divide em duas estações: A úmida e a seca. A úmida vai de outubro a maio; a estação seca ia de maio a novembro.

Agosto era o mês das tarefas do campo. A nobreza levava isso muito a sério e sempre participava de tais festejos. Os homens trabalhavam cantando e seguindo o ritmo. Depois de preparar os campos do Inca, do Sol e deles próprios, iam ajudar os parentes, os doentes ou lesados.

De Cuzco se enviavam arquitetos para planejar as obras e os projetos de maior importância, como por exemplo Pisac, onde o sistema de irrigação estava nas alturas do curso do rio Urubamba, onde os trabalhadores cavavam na rocha viva. Também eram construídos sistemas para desviar as geleiras das plantações.

Grande parte das atividades dos incas estava relacionada à irrigação. Havia imensos depósitos de água na fortaleza de Sacsahuamán, abaixo de Cuzco. Levavam a água subterrânea até a região das pedras. Magnificamente, o local era umedecido se tornando propício para o plantio. A técnica usada pelos engenheiros permitia levar a água até o alto dos vales; dali descia, e toda a região era regada por uma única corrente. A condução da água requeria um plano muito cuidadosamente traçado e determinado pelo conhecimento das condições hidrográficas, a natureza do solo e a conformação geral do terreno. Em todas as partes do mundo onde se tem praticado a condução da água, as técnicas são exatamente essas.

Setembro era o mês crítico, quando geralmente aconteciam as secas. Em toda a região, lhamas eram sacrificadas e oferecidas aos deuses da chuva. Se nenhum sinal de nuvem de chuva se formasse, se oferecia como sacrifício um homem, uma mulher ou uma criança. Os seres oferecidos ao sacrifício eram amarrados a portes, e nada era lhes dado para comer ou beber. O povo acreditava que dessa forma os deuses poderiam ficar tocados pelos gemidos desses seres e lhes enviar a chuva para matar sua sede.

A vida dos Incas: sociedade e cotidiano





Os quíchuas eram índios americanos dos andes sobre os quais os incas exerciam seu domínio. A pesar da notória diferença entre as tribos, há algo de comum entre elas. Os quíchuas eram — ou melhor, são, posto que ainda existem uns cinco milhões destes aborígenes — de mediana estatura, robustos e de mão grande, pulso pequeno e peito de altura desproporcional — desenvolvido para respirarem a grandes altitudes — pernas compridas e longos pés. Têm os pulmões salientes, narinas largas e olhos pequenos.

As mulheres são mais baixas e de constituição mais delicada, porém sua fragilidade é só aparente, posto que são capazes de realizar os trabalhos mais pesados; dão à luz e voltam a trabalhar no campo ao cabo de vinte e quatro horas. Muitas dessas mulheres possuem traços delicados; Algumas são consideradas belas; pelo menos assim o pareceram aos primeiros espanhóis que casaram com elas. Os primeiros retratos feitos delas pelos espanhóis mostram fisionomias muito delicadas, e um cronista, ao falar dessas mulheres escreveu: "As mais belas e bem apessoadas de todas que já vimos nas índias (...) Sumamente charmosas e bem conformadas"

Os peruanos têm uma grande resistência física, ao cabo de séculos vivendo na escassez e oxigênio dos andes, seu corpo se desenvolveu de tal sorte que podem realizar todas as atividades normalmente. Seu peito e seu pulmão são super desenvolvidos, de modo que a elevada altitude não lhes afeta a respiração.

Assim, este homem, resistente, incansável, robusto e adaptado pela natureza, constitui a ampla base da pirâmide social que foi o Império Incaico.

Era classificado como hatun-runa ou puric, como trabalhador fisicamente bem dotado; pertencia a uma comunidade territorial e se considerava um elemento indispensável na estrutura piramidal e decimal que foi o Império Inca.


Usavam um vestido que era como uma versão abreviada do traje de noite da época vitoriana inglesa: Um pano de lã com um buraco para sacar a cabeça, as bordas eram costuradas, deixando-se amplos cortes para sacar os braços. Era uma roupa simples e sem pretensões. Recebia o nome de onka e era feita de lã de alpaca. Também usavam um pedaço de lã nos ombros, yacolla, quando fazia frio.

A última peça de seu vestuário era uma espécie de cueca que consistia em uma faixa de lã que passava por entre as pernas e era amarrada na cintura; chamava-se chumpi. Começavam a usar esta peça quando completavam quatorze anos.

Assim pois, uma cueca, uma túnica e uma rústica capa constituíam todo o vestuário que o índio dispunha para cobrir seu corpo no frio clima dos Andes. Quando trabalhavam no campo, limitavam-se a prender suas longas cabeleiras com cordões de lã coloridos. Quando faziam uma viagem ou iam a uma festa, usavam um penteado característico, que o distinguia dos outros companheiros. Nas grandes solenidades, usavam túnicas mais largas, que chegavam aos joelhos, em que ele e sua esposa ostentavam o máximo de seu talento e habilidade; geralmente usavam sandálias.

A vestimenta da mulher também era simples; consistia em uma larga peça retangular de lã de alpaca, chamada de anacu, que passava pela cabeça, era grande o suficiente para cobrir todo o corpo e se amarrava na cintura. Ia até os joelhos, às vezes até os pés. Também usavam yacolla.

Os homens de prestígio, dentre os quais os governantes curacas, se vestiam de modo similar ao índio comum, porém a qualidade do tecido era suntuosa. Se distinguiam facilmente, se não pela túnica, pelos maciços pendentes, em geral de ouro. O próprio imperador se vestia igual a seus súditos, porém sua túnica era feita com a mais fina lã de Vicuña. Bem como o homem do povo, raramente tirava a túnica. Quando isso acontecia, queimava-lhe, como oferenda ao deus Sol; jamais usavam a mesma túnica duas vezes.

Na idade de vinte anos, esperava-se que o homem se casasse. Os ritos nupciais eram simples. Os noivos se davam as mãos e realizavam a cerimônia de troca de sandálias.

O matrimônio do homem de classe baixa era monogâmico. E dado que era a mulher que lhe preparava o que comer e beber, era um grande desastre para ele a morte da companheira. A poligamia existia apenas para os nobres, o próprio imperador possuía centenas de concubinas. Todas as classes governantes eram praticantes da poligamia.


A casa do lavrador era retangular, sem janelas, feita de pedra recozida do campo e com uma capa de barro; tinha apenas uma entrada, uma porta coberta por uma cortina de lã. Os suportes que sustentavam suas moradias eram feitos de arbustos cortados das montanhas. Essas casas rústicas ainda podem ser observadas em ruínas em Macchu-Picchu. O piso era feito de terra pressionada, coberto com pele de lhama ou de alpaca. Não havia móveis, o índio se sentava sobre o solo. Havia apenas prateleiras, para guardar utensílios de cozinha, e alguns paus fincados nas paredes, para pendurar as roupas e uma grande pedra onde as mulheres preparavam os alimentos. Dormiam no chão, sobre a pele de lhama e sobre uma manta.

A aldeia era planejada de acordo com um plano retangular, segundo se crê, por arquitetos profissionais enviados pelo Estado. Três ou quatro paredes retangulares formavam uma espécie de parede comum. Esse tipo de arquitetura pode ser observado nas ruínas de Ollantaytambo, a uns quarenta quilômetros de Cuzco.

O ciclo da vida cotidiana começava ao raiar do sol, O índio satisfazia sua sede com uma bebida fermentada de nome a'ka, ligeiramente embriagante, espessa, com sabor de malte. Logo o lavrador se encaminhava para os campos.

A família se reunia para tomar sua segunda refeição, geralmente manjares de raiz ou sopa com carne de lhama secada ao sol (chuñu). A refeição do entardecer, o cena, se tomava entre as quatro e cinco da tarde. Os homens se sentavam ao redor da vasilha, colocada em cima de um pano e se serviam com as mãos ou tomavam a sopa em taças de barro cozido. As mulheres sentavam fora do círculo.

As crianças eram educadas desde pequenas para o papel que iriam desempenhar durante o resto de suas vidas. Depois do nascimento, o bebê era lavado em água corrente e, ao quarto dia, colocado em um berço chamado quirau. Não se dava a ninguém um nome individual nos primeiros anos de vida. Os novos seres eram chamados de wawa (bebê). A família celebrava depois uma festa chamada ritu-chicoy (corte do pelo) e o nome permanente não se dava até que a criança chegasse à puberdade.

Aos quatorze anos de idade, o menino usava pela primeira vez a "cueca". Nas classes superiores, isso era acompanhado por uma peregrinação ao lugar de origem do estado inca de Huanacauri, no vale de Cuzco, e pelo sacrifício de lhamas realizados pelos sacerdotes. Em seguida, passava-se o sangue no rosto do garoto, que logo assumia o aspecto de um guerreiro e pronunciava em público um juramento de fidelidade ao Inca. Os meninos de classes superiores recebiam uma educação tradicional, que lhe faria apto para desempenhar, mais tarde funções administrativas.

As meninas também entravam na puberdade mais ou menos ao mesmo tempo, em uma encantadora cerimônia de corte de cabelo. Dava-se a elas o nome permanente. A mulher tinha a oportunidade de abandonar o ayllu e inclusive a classe social em que havia nascido. Se demonstrasse especial talento na arte de tecer, fosse graciosa ou muito bela, poderia ser eleita como "mulher escolhida" (nusta). Nessas condições, era conduzida a Cuzco ou a qualquer outra capital de província de uma das quatro partes do mundo, para aprender trabalhos especiais, tais como: tecer, cozinhar, ou os ritos do sol (religião). Podia chegar a ser esposa de um alto funcionário, ou, se a fortuna lhe favorecesse, converter-se em concubina do próprio soberano Inca. Porém, na grande maioria das vezes, os homens e mulheres nasciam, eram educados, e morriam no seu próprio ayllu.

A lhama era o único animal doméstico. Antes da chegada do homem branco, a América não conhecia o cavalo, nem o boi. Raramente usavam a lhama para montar. Sua lã extremamente resistente servia para fazer sacos, mantas, fardos e cordas; sua carne era aproveitada na alimentação.

Os primeiros Incas: o nascimento da civilização Inca



Antes dos incas se instalarem na região do Peru central, onde veio a ser construída a cidade de Cuzco, capital do Império Inca, o lugar era ocupado pelos povos quíchuas.

Conta a história que certo dia um homem chamado Manco Capac chegou ao Peru, com sua irmã Mama Ocllo, vindo do lago Titicaca. Ele era filho do Sol e sua missão era transmitir aos homens as leis e a civilização. De fato, manco Capac civilizou o povo quíchua a ponto de construir um grande império, como foi o Império Inca.

Inicialmente, o nome Inca era dado a todos quantos se juntassem ao clã liderado por Manco Capac. Mais tarde, o nome passou a designar os soberanos do império.

Os primeiros Incas: tribos pré-incaicas




Vários tipos de culturas se desenvolveram na região andina antes da instituição do Império Incaico. O conjunto, espalhado pela costa e pela serra, teve seu apogeu entre 300 e 900 d.C.

No período pré-clássico, no litoral, se desenvolveram as culturas dos reinos Chimu, Cuismancu e Chuquimancu. O reino Chimu teve como capital a cidade de Chanchán, cujas ruínas cobrem hoje uma área de 18km²; outras cidades importantes foram Pacatnamu e El Purgatorio.

Conheciam a metalurgia e a cerâmica, adoravam o Sol (Patá) e a Lua (Si) e faziam sacrifícios humanos com crianças de 5 anos no altar da deusa Lua. No reino Cuismancu, a cidade-santuário de Pachamac possuía monumentos muito importantes.

Ainda no pré-clássico, nas serras, floresceram as culturas de Colla, do Utcubamba, de Cajamarca, de Huamachuco e a primitiva Incaica. A cultura colla ou aimara foi fruto da expansão civilizadora de Tiahuanaco, (algumas pessoas a identificam como cultura Chullpa, devido a suas famosas torres funerárias).


A cultura do Utcubamba ficou conhecida pelas “aldeias da morte” ou kullpís, onde os mortos eram enterrados; a cultura incaica primitiva foi descoberta durante as escavações na fortaleza de Sacsahuamán, nas cercanias de Cuzco.

No período seguinte, o clássico, desenvolveram-se na costa da região andina a cultura Mochica, ou Proto-Chimu, que se estendeu dos vales de Chicama, Moche, e Virú até Chao, Huamazaña e Nepeña. Conhecia a arte têxtil e sua arquitetura se caracterizava pelas huacas, pirâmides construídas de terra.

Com traços semelhantes a esses, foram encontradas na costa central a cultura Proto-Lima e nos vales de Pisco, Ica e Nazca a cultura Nazca, de grande expressão artística.

Na serra, ainda se destacaram algumas culturas clássicas como a de Recuay, com sua arquitetura subterrânea e a de Tiahuanaco, formada por outras três culturas serranas anteriores: a de Chiripa, Pucara e Tiahuanaco antigo. Os tiahuanacanos conheciam a domesticação da lhama e sua escultura estava intimamente ligada à arquitetura.

Os primeiros Incas: a procedência do homem americano



Desde que foram encontrados os primeiros indícios de vida humana na América, muitos mistérios pairam sobre os restos dessas civilizações que um dia dominaram o solo americano:

. Que idade têm as ruínas e que mensagens podem nos trazer?
· Por que exatamente essas civilizações se extinguiram?
· Como se desenvolviam e porque retrocederam as sociedades indígenas na época da conquista européia?
· Se a civilização veio de fora, como, quando e de onde foi e de que modo evoluiu?

A primeira forma que se encontrou de explicar o povoamento americano foi procurando em documentos antigos indícios de alguém que pudesse ter atravessado o oceano e colonizado uma área tão extensa.

Então, baseado na Bíblia judaica, foi lançado o livro A Bíblia Poliglota (1569-1573). Escrito pelo estudioso Arius Montanus, esse livro expõe a tese de que a América teria sido povoada por dois filhos de Joctã, tetraneto de Noé: Ofir, que teria povoado o noroeste americano, e Obal, que teria povoado o Brasil.

Outra hipótese diz que o homem americano teve procedência cartaginesa: um relato de Aristóteles conta a história de alguns marinheiros de Cartago que teriam descoberto uma grande ilha com selvas, frutos e rios navegáveis, distante da cidade uns oito dias de navegação.

Acredita-se, também, que o povo fenício, fundador da cidade de Cartago e conhecido pelo domínio da navegação, pode ter chegado à América muito antes de se ter qualquer conhecimento sobre terras além do oceano. A inscrição “Tyro Phenicia, Badezir primogênito de Jethabaal”, gravada na Pedra da Gávea, no Rio de Janeiro, é um indício de que os fenícios podem ter estado no Brasil há cerca de 2800 anos. A hipótese e a inscrição não são aceitas por todos os estudiosos, mas o frei Gregório Garcia, baseado ainda em Aristóteles e Herodoto, sustenta a tese e assegura terem sido encontradas inscrições fenícias também na Venezuela e Guatemala.

No meio de tantos estudos e teorias formuladas, a hipótese mais aceita hoje é a de que o homem americano, assim como muitos povos europeus, africanos e asiáticos, é descendente direto do povo atlante, habitante da grande ilha de Atlântida, hoje supostamente submersa nas águas do Oceano Atlântico.

Essa tese não se baseia apenas na conhecida lenda de Atlântida. Há provas incontestáveis de que as tribos indígenas da América e da África, a antiga civilização chinesa e inúmeros outros povos de todos os continentes têm um ancestral comum. Uma dessas provas é a semelhança inexplicável entre certas palavras, como a palavra que designava a divindade maior desses povos: na Grécia se chamava Teos ou Zeus; nas regiões onde se falava o latim, Deus; em Sânscrito, se escrevia Dyaus; no México antigo, os astecas chamavam Teo ou Zeo, e na Europa os celtas diziam Día, Ta ou Zia. Outra semelhança pode ser notada nas pirâmides astecas, muito semelhantes às egípcias e aos zigurates babilônicos.

Inca, o Império do Ouro


Entre todos os povos e culturas da América pré-colombiana, a região Andina, área de ocupação do Império Incaico, se destacou pelo alto nível de organização social e política encontrado quando da chegada dos europeus.

No seu apogeu, o império chegou a ocupar mais de um milhão e setecentos mil quilômetros quadrados, o equivalente a aproximadamente 9,5% da área da atual América Meridional.

Em meados do século XIV, o reino foi dividido em duas partes; a civilização, fragilizada, foi invadida pelos espanhóis e, não suportando a situação, entrou em decadência.

Vejamos agora um pouco sobre essa brilhante civilização: sua organização social, cultural, política e artística.

Prefácio à 2ª edição

1. Os primeiros Incas
a) A procedência do homem americano
b) Tribos pré-incaicas
c) O nascimento da civilização Inca

2. A vida dos incas
a) Sociedade e Cotidiano
b) Aspectos político-econômicos
c) Arte e ciência

3. Os últimos Incas
a) Os imperadores e as guerras de expansão
b) A morte da civilização Inca

Considerações finais e Referências



SOBRE

TÍTULO ORIGINAL: Inca, o Império do Ouro

AUTORES:
Ana Roberta Ferreira
André de Barros Coelho
Fernanda Cabral Barbosa

PROFESSOR/ORIENTADOR: Daniel Campbell Pena

DISCIPLINA: Teoria e História da Arquitetura e Urbanismo II (Faculdade de Arquitetura e Urbanismo / Instituto Tecnológico / Universidade Federal do Pará)

LOCAL: Belém-PA, Brasil

ANO: 1999

CONTATO: abcoelho@superig.com.br

sexta-feira, 23 de julho de 2010

São Genésio*

Ceumar Coelho

Santinho pequenininho
de coração assim assim pequenininho,
protege tua legião.

Abençoa nosso ofício,
que o drama, que o riso,
de forma assim assim pequenininha,
conceda a todos coração.


Abençoa nosso ofício,
que o drama, que o riso,
de forma assim assim pequenininha,
conceda nosso ganha-pão.

São Genésio,
protege tua legião.


* São Genésio: segundo a tradição cristã católica romana, é o padroeiro dos músicos e atores.

sábado, 24 de abril de 2010

Antiga ocorrência policial

André Coelho

Bem ali,
na Rua da Cadeia,
um alemão matou uma gorda senhora que tocava violão
na mesma calçada em que um indiozinho todos os dias vem vender seus cordões de contas coloridas.

Ninguém sabe,
ninguém viu.
Ninguém supõe.

Mas tenho impressão de que, neste lugar, as paredes falam.

Paraty, RJ
24 de abril de 2010

De volutas e beirais

André Coelho


Uma ruela
que se perde em outra ruela,
que se perde em outra ruela,
que vai dar no mar.

Uma igrejinha de uma torre só,
uma outra sem torres,
um Caminho do Ouro sem ouro.

Aquilo que fez a vida um dia parar
hoje é motivo de vida.

E a mesma vida segue,
volutosa,
barroca,
simples,
antiga...
correndo parada.
"Como se não existisse chegada
na tarde distante,
ferrugem 
ou nada."
(Djavan - A Rota do Indivíduo)

Paraty, RJ
24 de abril de 2010

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Comentário à 'Carta aberta ao blog "Um que Tenha" (e à mídia brasileira)'

André Coelho

(conferir postagem anterior: Cristofobia - vejam que situação!)



Essa é uma questão que já tá rolando há algum tempo, e que começa a se configurar em um fenômeno social seríssimo de discriminação e quase intolerância religiosa. E olha que, hoje, no Brasil, intolerância religiosa já é crime.

Não podemos admitir isso. Não é porque sejamos cristãos, pacificadores em nossa maioria, que tenhamos que aceitar calados essa separação que a mídia tem ensinado a sociedade a fazer, de que os cristãos (evangélicos) são pobres, burros e sem cultura.

As mulheres, os gays, os negros, os índios, todos têm conquistado seu espaço. Está na hora dos cristãos, com sabedoria, reinvidicarem os mesmo direitos, já que estamos numa república livre e pretensamente igualitária, ou que busque a igualdade.

Além disso, está na hora dos cristãos caírem em si e pararem de viver como se fossem guetos. Isso não é saudável, não é cristão, não é bíblico. Como bem citado aí em cima, a maré gospel brasileira de hoje vai completamente de encontro (contra) aos ensinamentos jesuanos de sermos "sal da terra e luz do mundo".

Só seremos a luz do mundo se estivermos no mundo. Só seremos sal da terra se permanecermos no mesmo "planeta" dos demais humanos. Foi por isso que Jesus não pediu a Deus que nos tirasse do mundo, porém que nos livrasse do mal.

É hora de parar, refletir, unir as forças e o pensamento para "brigarmos" por nosso espaço dentro da república brasileira. Precisamos espalhar esta idéia. Passar adiante situações como a vivida agora pelo Sérgio e pela Marivone. Levar essa discussão para nossas igrejas, para os grupos de estudo da Bíblia, salas de aula, universidades, consultórios, para as ruas, elevadores e para dentro de nossas casas.

Que Deus nos abençoe a todos com inquietação, discernimento, coragem, muita graça e muita paz.

Cristofobia: vejam que situação!

André Coelho


Sérgio e Marivone, do grupo Baixo e Voz, foram sutilmente "barrados no baile", ao tentar divulgar seu trabalho em um blog que distribui música brasileira em meio digital.

O blog é muito conhecido, acessado, e se chama Um que Tenha.
(clique aqui para acessar o blog).

Por causa disso, Sérgio e Marivone, que são cristãos evangélicos e são excelentes músicos, escreveram ao blog Um que Tenha e à mídia brasileira uma carta aberta, que está sendo comentada e apoiada por alguns dos nossos principais músicos da MPB Cristã. A carta foi publicada no site Cristianismo Criativo.
(clique aqui para ler a carta).

Acontecimentos como este estão provando o quão discriminadora ainda é a nossa sociedade. Não é à toa que, nas últimas décadas, as mulheres, os negros, os indígenas, os gays e outros grupos sociais têm "brigado" por seu espaço na nação brasileira.

Será que chegou a nossa hora de lutar pela mesma causa?

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

paráfrase do salmo 23

André Coelho

O Senhor é meu pastor, o meu único pastor, e nada, nem o bem, nem o mal, nem felicidade, nem tristeza, nem vitórias, nem derrota – nada – me faltará.

Ele me conduz a alma para o descanso, como se eu estivesse junto de campos verdes e fontes de água limpa.

Nos dias quentes, o Senhor refresca a minha alma; nos dias de dor, me consola; nos dias de angústia, me renova as esperanças.

Por amor do seu nome, ele me conduz por caminhos nos quais posso conhecer a justiça.

Há um vale escuro, como se fosse a sombra mais escura, a sombra da própria morte. Nesse vale, por entre os montes, há perigos e males terríveis. Porém ainda que eu ande por esse vale na minha vida, não terei medo dos males que esperam por mim, porque tu, Senhor, estás do meu lado, mostrando por onde seguir.

Quando eu vacilo ou resolvo tomar por conta própria um caminho diferente, o teu bordão me repreende e me traz de volta à trilha na qual nunca estarei sozinho. Quando me machuco nas pedras ou espinhos dos caminhos, o teu cajado me dá consolação e conforto.

Quando os homens que me odeiam, porque não te conhecem, zombam de mim, tu me alimentas com um banquete espiritual e perfumas a minha alma com as mais puras essências.

Por todas essas coisas, eu tenho certeza de que a tua bondade me seguirá todos os dias da minha vida, quando eu estiver bem, ou quando estiver machucado. Também sei que, quando eu vacilar, a tua misericórdia será comigo.

Assim serão todos os meus dias daqui pra frente: como se eu habitasse na própria casa do Senhor. Assim será hoje, amanhã e depois de amanhã.

Só de estar em tua companhia,
meu coração já começou mudar.
Passei a ver aquilo que não via,
tua presença vai me transformar.
(Gerson Borges - Tua Presença Vai me Transformar)


Belém, Pará
03 de janeiro de 2010
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